A imunidade de ITBI referente à transmissão de imóveis para integralização do capital social da empresa quando esta não tem faturamento
O atual momento da economia e a grave crise financeira que estão enfrentando as Fazendas Públicas da União, Estados e Municípios têm aumentado ainda mais a já elevada sede arrecadatória do Fisco.
E nesse impulso por arrecadar, muitas leis acabam sendo ignoradas, fazendo com que o contribuinte se veja cada vez mais forçado a se valer do Poder Judiciário para defender seus direitos. Não é novidade que muitas vezes o Fisco sabe que está desrespeitando a lei, mas prefere pagar para ver, pois muitos contribuintes não ingressam na justiça.
Um exemplo clássico do desrespeito à legislação, em busca de arrecadação a qualquer preço, é a cobrança de ITBI (Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis) sobre a transferência de imóveis para integralização de capital em empresas, quando a atividade preponderante destas, em determinado período, não é transação imobiliária.
Explica-se: a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional concedem imunidade tributária de ITBI a empresas que tenham aportado bens imóveis para integralização do capital social, desde que a sua atividade preponderante, em determinado período, não seja de compra e venda desses bens, sua locação ou arrendamento mercantil.
Tal previsão está contida no artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal[1], bem como nos artigos 36 e 37 do Código Tributário Nacional[2].
A regra determina que o imposto não incidirá se a empresa não tiver mais de 50% de sua receita operacional decorrente de transações envolvendo compra e venda, locação e arrendamento mercantil de bens imóveis. Para realização desse cálculo, serão considerados os dois anos anteriores e os dois anos seguintes à aquisição do imóvel.
Caso a empresa tenha iniciado suas atividades após a aquisição do bem imóvel, com sua integralização ao capital social, o período a ser computado para o cálculo serão os três anos seguintes à data da integralização.
A questão que se põe, e que vem sendo utilizada por muitos municípios para cobrar o imposto, é nos casos em que a pessoa jurídica se manteve inativa no período do cálculo. O fisco tem entendido que a finalidade da lei é fomentar a atividade empresarial e que, se a empresa esteve inativa, não teria direito à imunidade do imposto.
Todavia, o entendimento majoritário da jurisprudência, principalmente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, é no sentido de conceder a imunidade do ITBI também à pessoa jurídica que permanece inativa no período da verificação.
A lógica é a de que, para incidir o imposto, a receita operacional da empresa deveria ser preponderantemente decorrente da compra e venda de imóveis ou direitos relativos a eles, de sua locação ou arrendamento mercantil. Ou seja, para incidir o ITBI a receita operacional da empresa, decorrente de tais atividades, deveria ser superior a 50%.
Tendo em vista que a empresa esteve inativa no período sob análise, é evidente que a receita operacional não decorreu preponderantemente de transações imobiliária, pois ela sequer existiu.
Considerando-se que para a incidência do imposto deve-se aplicar a lei em seu sentido literal, não cabem interpretações abrangentes com o intuito de exigir o imposto de quem não é seu sujeito passivo. A lei não exige que a empresa permaneça ativa para que tenha direito à imunidade.
E esse entendimento está estampado em diversos julgados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.[3]
Assim, em face da atitude que algumas prefeituras têm adotado, a discussão judicial da exigência do imposto é o caminho mais acertado, pois há grande probabilidade de obtenção de provimento judicial no sentido de concessão da imunidade do ITBI.
[1] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
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II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
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I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
…
[2] Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior:
I – quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;
II – quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra ou com outra.
Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a que foram conferidos.
Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição.
[3] Apelação Cível Nº 70066275934, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 04/11/2015; Apelação Cível Nº 70064203565, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 24/06/2015; Apelação e Reexame Necessário Nº 70063763726, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 11/03/2015; Apelação Cível Nº 70056535966, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em 02/01/2016; Agravo de Instrumento Nº 70064833650, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 16/12/2015; Apelação e Reexame Necessário Nº 70065415952, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em 11/09/2015; Apelação Cível Nº 70065074866, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em 01/09/2015; Apelação e Reexame Necessário Nº 70059615229, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em 02/10/2014; Apelação e Reexame Necessário Nº 70050368133, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adriana da Silva Ribeiro, Julgado em 26/08/2014; Apelação Cível Nº 70059616508, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Newton Luís Medeiros Fabrício, Julgado em 06/08/2014; Apelação Cível Nº 70047719653, Segunda Câmara Cível – Serviço de Apoio Jurisdição, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, Julgado em 14/08/2013; Apelação Cível Nº 70047179163, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 15/05/2013; Apelação e Reexame Necessário Nº 70051338937, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 31/10/2012; Apelação Cível Nº 70035579523, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 09/11/2011