
Compliance como pilar de prevenção do assédio moral no ambiente de trabalho
Resumo
O compliance está cada vez mais presente na rotina das empresas, incluindo as construtoras e incorporadoras, e se tornou um verdadeiro pilar na prevenção de casos de assédio no ambiente de trabalho. Um primeiro aspecto que é tratado no artigo diz respeito aos impactos financeiros e sociais que a ocorrência de assédio moral pode provocar nas empresas. Em seguida, coloca-se em destaque o papel do compliance, em especial, nas construtoras e incorporadoras, com vistas a estabelecer as práticas que podem ser adotadas pelas empresas para promover um ambiente de trabalho ético e respeitoso, evitar a ocorrência de casos de assédio moral e, assim, mitigar os riscos, especialmente na área trabalhista. Por fim, apresentam-se alguns aspectos práticos para a implementação do compliance na prevenção do assédio moral, como a elaboração do código de conduta, o treinamento dos empregados e executivos da empresa, a criação de canais de denúncia e a realização de monitoramento e auditorias.
Introdução
O compliance é um termo que está cada vez mais presente nas organizações empresariais, inclusive do setor imobiliário, e significa “agir em conformidade”, isto é, agir de acordo com a legislação vigente, de acordo com padrões éticos e de integridade para a atuação da organização. Em uma pesquisa realizada pela KPMG no ano de 2021, 75% dos executivos seniores entrevistados afirmaram que a cultura de compliance é essencial para o sucesso da estratégia da empresa1, reconhecendo a relevância a sua relevância para quem pretende ter negócios de sucesso e garantir sua sustentabilidade a longo prazo.
Nesse sentido, coloca-se a questão sobre como tratar a ocorrência de assédio moral no ambiente de trabalho, com o desafio de a empresa atuar não somente na repressão de casos dessa natureza, mas também, e principalmente, na prevenção de tais ocorrências. É nesse contexto que o compliance surge como uma ferramenta de grande relevância exatamente para a prevenção de casos de assédio no ambiente laborativo, ao proporcionar a criação de políticas internas, canais de denúncia e procedimentos de auditoria aptos ao combate de condutas contrárias aos padrões éticos estabelecidos.
Em face desse cenário, o presente artigo busca demonstrar de forma prática como o compliance é um importante pilar para a prevenção de casos de assédio no ambiente de trabalho, demonstrando os impactos financeiros e sociais da existência de situações dessa natureza nas empresas, qual o papel do compliance nas construtoras e incorporadoras e de que forma estas organizações empresariais podem implementar um programa de compliance eficiente para a prevenção do assédio moral dentro da organização.
1. O impacto financeiro e social do assédio moral nas empresas
O assédio moral é um problema enfrentado por muitas empresas em todos os ramos de atividade empresarial. Segundo informações do Tribunal Superior do Trabalho, são recebidas, em média, 6,4 mil ações relacionadas ao assédio moral no ambiente de trabalho por mês pela Justiça do Trabalho2. Além dos processos judiciais, são inúmeras as denúncias recebidas pelo Ministério Público do Trabalho. Nos primeiros 7 meses de 2023, por exemplo, o MPT registrou 7.627 denúncias de assédio moral, tendo um aumento de 88% em relação ao ano anterior3.
De forma simplificada, o assédio moral pode ser conceituado como uma conduta abusiva que, de forma repetitiva e prolongada, visa prejudicar a integridade psíquica e moral de um trabalhador4. Não se trata de uma ação isolada: o assédio exige a prática de condutas reiteradas ao longo do tempo com a intenção de prejudicar a vítima e causar danos à sua integridade psíquica. A habitualidade da conduta e a intencionalidade do agente são, portanto, indispensáveis à caracterização do assédio moral.5
Situações de assédio moral podem impactar diretamente nos resultados financeiros e no clima organizacional das empresas. Sob o ponto de vista financeiro, as repercussões mais significativas estão relacionadas à redução da produtividade, altos índices de rotatividade no quadro de funcionários – o chamado turnover –, o aumento significativo dos riscos jurídicos e, consequentemente, do passivo trabalhista.
Sabe-se que a produtividade dos trabalhadores está diretamente relacionada à existência de um ambiente de trabalho saudável. De acordo com o estudo publicado pela Harvard Business Review6, colaboradores que enfrentam bullying e assédio no local de trabalho podem experimentar uma queda de até 25% em sua produtividade, evidenciando que o assédio moral tem um impacto direto no desempenho dos colaboradores e, por conseguinte, nos resultados e na eficiência das empresas. Deste modo, o assédio moral prejudica não apenas o desempenho individual dos colaboradores, mas também o resultado geral da empresa, motivo pelo qual investir na prevenção e no combate ao assédio moral não é apenas uma questão de ética, mas também uma estratégia empresarial importante para manter elevada a produtividade da equipe e maximizar os resultados da empresa.
Ainda, sob o viés financeiro, outro aspecto a ser pontuado é que a ocorrência de casos de assédio leva ao aumento da taxa de turnover, isto é, da taxa de rotatividade de empregados na empresa. Isto porque tais situações levam a pedidos de demissão por parte daqueles afetados direta ou até indiretamente por casos de assédio, o que traz repercussões de ordem financeira, uma vez que são consideráveis as despesas com a rescisão contratual e com recrutamento, seleção, treinamento e integração de novos profissionais. Assim sendo, evitar a ocorrência de casos de assédio de forma ativa é fundamental para a redução das taxas de turnover e, consequentemente, para a manutenção da saúde financeira da organização.
Outrossim, as ações judiciais e as ações civis públicas que versam sobre assédio moral igualmente representam um ônus financeiro significativo para as empresas e podem ensejar condenações em valores expressivos. No ano de 2015, em uma Ação Civil Pública bastante emblemática, uma construtora do Rio de Janeiro foi condenada a pagar indenização por dano moral coletivo de R$ 5 milhões em decorrência de assédio moral praticado por seu gerente jurídico7. Além da condenação pecuniária, a empresa foi obrigada a impedir qualquer prática de assédio moral, elaborar um programa permanente de prevenção ao assédio, criar mecanismos de denúncia, entregar aos empregados cartilhas sobre o tema e realizar palestras de conscientização, a cada seis meses, para a manutenção de um ambiente de trabalho moralmente sadio.
Para além do aspecto financeiro, o assédio moral também causa impactos de ordem social nas empresas. Colaboradores que enfrentam situações de assédio experimentam frequentemente danos à sua integridade psíquica, os quais não apenas afetam a saúde mental individual, mas também se estendem para o âmbito profissional, prejudicando as relações de trabalho e o seu desempenho. Ademais, o assédio moral gera um clima organizacional negativo, que prejudica todos os funcionários, na medida em que uma cultura que tolera o assédio contribui para a desmotivação generalizada, prejudica a coesão da equipe e, por consequência, reduz a produtividade e, até mesmo, o interesse das pessoas em trabalhar na empresa.
Outro ponto importante de se destacar em relação ao clima organizacional é a repercussão negativa dos casos de assédio moral na reputação das empresas e a possível desvalorização da sua marca perante clientes, acionistas, investidores, consumidores e perante a sociedade como um todo. Em uma época em que pautas como o ESG e o compliance estão efervescentes no mundo corporativo, não há espaço para tolerância em relação a condutas de assédio dentro das organizações empresariais. Hoje, as empresas, de modo geral, desejam realizar negócios com organizações que respeitam e investem em questões de ordem social e compliance, sendo fundamental que estas assegurem um meio ambiente de trabalho saudável, seguro, digno e livre de assédio para se manter competitivas no mercado.
Trata-se, então, de adotar uma abordagem proativa na prevenção e no combate ao assédio moral para garantir um ambiente de trabalho seguro, saudável e produtivo a todos os trabalhadores e, consequentemente, manter a empresa competitiva e sustentável no mercado. Ao comprometer-se com a prevenção e com o combate ao assédio moral, as empresas não apenas cumprem com suas responsabilidades éticas e legais, mas também garantem um ambiente de trabalho que promove o bem-estar de todos os seus colaboradores, garantindo, assim, a sustentabilidade e o sucesso do negócio no longo prazo.

2. O papel do compliance nas construtoras e incorporadoras
O termo compliance refere-se ao cumprimento de regulamentos e diretrizes tanto internos quanto externos a uma organização, os quais a obrigam a respeitar as leis e normas específicas de um determinado país. Essa conformidade não se restringe apenas ao aspecto legal, mas abrange todas as obrigações necessárias para a condução das atividades comerciais, visando a redução de riscos para a própria empresa. O compliance é uma ferramenta relativamente recente que permite às organizações identificar e administrar os riscos associados à violação das leis e normas internas da empresa.8
Nos últimos anos, o compliance vem ganhando destaque no setor da construção civil e da incorporação imobiliária. Em um contexto no qual grandes projetos são desenvolvidos e transações financeiras significativas ocorrem regularmente, o compliance desempenha um papel vital na manutenção da integridade, transparência e responsabilidade da empresa. Assim, a sua implementação favorece a prevenção de processos judiciais e evita danos irreparáveis à reputação da empresa.
Nesse sentido, o compliance possui um papel fundamental para garantir a sustentabilidade dos negócios a longo prazo, demonstrando que as construtoras e incorporadoras que adotam uma cultura de compliance possuem compromisso com a ética empresarial e a conformidade legal. Isto, por sua vez, pode atrair investidores, clientes e parceiros comerciais que valorizam a integridade e a transparência. Por outro lado, empresas com reputação manchada por escândalos de corrupção ou violações regulatórias enfrentam dificuldades para obter financiamento, fechar contratos e manter relacionamentos comerciais sólidos.
Uma das áreas em que o compliance desempenha papel crucial no setor imobiliário é na gestão de contratos, pois muitos projetos neste âmbito envolvem uma rede complexa de fornecedores, subempreiteiros e parceiros comerciais, tornando essencial a implementação de políticas e procedimentos rigorosos para garantir que todos os contratos sejam celebrados e executados de forma ética e legal. Isso inclui a verificação da conformidade com as leis trabalhistas e ambientais, a prevenção de suborno e corrupção e a proteção dos interesses da empresa em todas as transações.
Além disso, o compliance também desempenha um papel crucial na promoção da segurança no local de trabalho e na proteção dos direitos dos trabalhadores. De modo especial, as construtoras e incorporadoras são responsáveis pela segurança e bem-estar de milhares de trabalhadores que atuam em canteiros de obras, e o não cumprimento das normas de segurança pode resultar em acidentes graves e até fatais. Da mesma forma, o não respeito aos direitos trabalhistas, como salários justos e condições de trabalho adequadas, pode levar a litígios trabalhistas e danos à reputação da empresa.
Nessa seara, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)9 recomenda às empresas, independentemente de sua natureza jurídica, que adotem medidas preventivas, tais como: disponibilização de manuais no website da organização, criação de canais de comunicação e de denúncias, contratação de auditoria independente, aplicação de código de condutas, política de gestão de pessoas etc., visando o desenvolvimento de práticas relacionadas à governança corporativa.
O compliance no setor de construção civil e incorporação imobiliária abrange uma ampla gama de diretrizes éticas e legais, todas fundamentais para garantir a integridade, transparência e responsabilidade nas operações empresariais, tendo em vista as leis trabalhistas – incluindo as normas de segurança e saúde ocupacional – e ambiental, as leis de licenciamento, as leis de concorrência e antitruste e as leis anticorrupção. As diretrizes éticas e legais são fundamentais para orientar as práticas de compliance das empresas do setor, uma vez que, ao aderir a essas diretrizes, as empresas protegem sua integridade, cumprem suas obrigações legais, promovem a segurança e o bem-estar de todas as partes interessadas e demonstram seu compromisso com a responsabilidade corporativa e o desenvolvimento sustentável.
Da mesma forma que as diretrizes éticas e legais orientam a implementação do compliance, a cultura organizacional desempenha um papel crucial na eficaz implementação do compliance em uma empresa, inclusive no setor imobiliário. Assim, empresas que priorizam exclusivamente os resultados, negligenciando os processos, valorizam a individualidade em detrimento do coletivo e possuem comunicação inadequada, o que favorece a prática do assédio moral, tanto em nível individual quanto organizacional10. Em contrapartida, uma cultura organizacional positiva, em que há comprometimento com a integridade e ética, liderança exemplar, comunicação clara e aberta, valorização da educação com oportunidades de treinamentos, e responsabilização pelo descumprimento de políticas, potencializa a eficiência de um plano de compliance.
No mundo contemporâneo, novos modelos de negócios surgem incessantemente, impulsionados em parte pela constante disrupção e em parte pela interligação global proporcionada pela internet, emergindo novos desafios sociais, como a sustentabilidade e a responsabilidade socioambiental. Diante disso, é crucial que tanto empresas privadas quanto públicas cultivem valores éticos, integridade e responsabilidade, tanto em relação aos seus próprios interesses quanto aos da sociedade como um todo.11
Dessa forma, o compliance é uma parte essencial da gestão empresarial responsável e sustentável no setor imobiliário, visto que as empresas que investem em programas abrangentes de compliance não apenas mitigam riscos legais e financeiros, mas também constroem uma reputação de integridade, transparência e responsabilidade que é inestimável em um mercado cada vez mais competitivo e exigente.

3. Aspectos práticos da implementação do compliance na prevenção do assédio moral
A implementação prática do compliance na prevenção do assédio moral requer uma abordagem abrangente, que englobe a definição de políticas internas específicas sobre o tema, o estabelecimento de canais de denúncia eficazes, a existência de planos de ação rápidos e eficientes e a prática de programas de educação, capacitação e orientação de todos os empregados sobre a temática do assédio. Ao adotar essas práticas, as empresas podem criar ambientes de trabalho mais saudáveis, éticos e produtivos, onde todos os funcionários se sintam valorizados e respeitados.
O ponto de partida de qualquer programa de compliance eficiente é a elaboração de um código de conduta, que possui como objetivo “respaldar os negócios e atender à legislação do Direito do Trabalho, para que todas as decisões sejam tomadas com base na honestidade e no respeito às pessoas, aos clientes, aos fornecedores e ao público em geral”12. Contudo, por vezes, existe uma deficiência na adesão ao código de conduta da empresa decorrente da sua má elaboração, com textos minimalistas ou extensos demais e com conteúdo impositivo e sem qualquer caráter pedagógico.13
Para uma elaboração eficiente do código de conduta é necessário observar alguns princípios como: (i) precisão e clareza na escrita das determinações, (ii) publicidade da existência do código de conduta, (iii) acessibilidade do código (disponibilização aos colaboradores) e (iv) a previsão de prestação de contas sobre as ações realizadas no âmbito do compliance14. Assim, um código de conduta claro e bem comunicado desempenha um papel crucial na prevenção do assédio moral, de modo a estabelecer expectativas claras, promover uma cultura de respeito e responsabilidade e proteger os funcionários contra comportamentos prejudiciais.
Outro fator importante na implementação do programa de compliance refere-se ao treinamento dos empregados e executivos da empresa, sendo essencial para criar uma cultura de trabalho livre de assédio moral. Esse treinamento aumenta a conscientização sobre o assédio, promove o respeito entre colegas, desenvolve habilidades de comunicação e fornece orientações claras para denunciar o assédio. Além disso, os líderes aprendem sobre sua responsabilidade em prevenir e abordar o assédio, demonstrando o compromisso da empresa com um ambiente de trabalho seguro e inclusivo, o que pode melhorar a reputação da empresa, aumentar a satisfação e o engajamento dos funcionários, bem como reduzir o risco de litígios relacionados ao assédio moral.
Para que o treinamento consiga atingir os objetivos pretendidos ele deve se ater aos seguintes requisitos: a) deve abranger os programas de compliance e as leis relacionadas ao negócio, ao combate à corrupção e prática trabalhista; b) deve ser adaptado às responsabilidades individuais ou grupais dos empregados; c) deve oferecer espaço para esclarecer dúvidas e questões; d) deve, normalmente, ser conduzido por pessoal interno, exceto em casos que exigem especialização externa; e) o material de apoio deve ser adequado ao conhecimento, experiência e habilidades dos funcionários; f) a empresa deve documentar todo o treinamento, incluindo materiais fornecidos e dados dos participantes; e g) a participação nos treinamentos deve ser obrigatória, e a sua ausência deve resultar em falta disciplinar.15
Além disso, o principal procedimento a ser adotado pelas empresas para o combate ao assédio moral no ambiente de trabalho é a instituição de um canal de denúncias, ferramenta que assegura o cumprimento das práticas de compliance e de governança corporativa dentro da organização empresarial. Nessa linha, a Lei nº 14.457/2022, que trata especificamente acerca do assédio sexual e outras formas de violência à mulher no âmbito do trabalho, prevê a obrigatoriedade da existência de um canal de denúncias e da apuração de situações de assédio pelas empresas em seu artigo 23, inciso II, que estabelece, em empresas que possuem CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, a obrigatoriedade da “fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias, para apuração dos fatos e, quando for o caso, para aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio sexual e de violência, garantido o anonimato da pessoa denunciante, sem prejuízo dos procedimentos jurídicos cabíveis”.
Os canais de denúncia são espaços disponibilizados a todos os empregados, prestadores de serviços e, por vezes, terceiros, para que possam denunciar, por exemplo, situações de assédio, discriminação, preconceito, violação ao Código de Ética da empresa e outras ocorrências que devam ser comunicadas à empresa. Em geral, esses canais são terceirizados a empresas especializadas ou escritórios de advocacia, a fim de garantir a confidencialidade das informações e a imparcialidade na condução das denúncias efetuadas. Uma vez recebida a denúncia, esta deverá ser encaminhada para o setor responsável na empresa para que se possa investigar de forma minuciosa e, se necessário, se aplique sanções administrativas e/ou judiciais, dando o adequado tratamento à questão denunciada. Os canais devem ser acessíveis a todos os funcionários, de modo a permitir que sejam relatadas situações de forma anônima, garantindo investigações eficazes. Além disso, é indispensável que os procedimentos para investigar e lidar com denúncias de assédio moral de forma rápida e eficaz sejam bastante claros a todos, para que os funcionários tenham confiança no processo e segurança para, de fato, realizarem denúncias, as quais devem ser tratadas com seriedade, garantindo o devido processo e proteção aos direitos de todas as partes envolvidas.
Além do canal de denúncias, é de se destacar que, desde março de 2023, a Portaria MTP 4219 entrou em vigor e as organizações obrigadas a constituir CIPA, nos termos da NR 5, passaram a ser obrigadas a adotar medidas de prevenção e combate ao assédio sexual e demais formas de violência no âmbito do trabalho, previstas na Lei 14.457/2022, quais sejam:
a) inclusão de regras de conduta a respeito do assédio sexual e de outras formas de violência nas normas internas da empresa, com ampla divulgação do seu conteúdo aos empregados e às empregadas;
b) fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias, para apuração dos fatos e, quando for o caso, para aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio sexual e de violência, garantido o anonimato da pessoa denunciante, sem prejuízo dos procedimentos jurídicos cabíveis; e
c) realização, no mínimo a cada 12 (doze) meses, de ações de capacitação, de orientação e de sensibilização dos empregados e das empregadas de todos os níveis hierárquicos da empresa sobre temas relacionados à violência, ao assédio, à igualdade e à diversidade no âmbito do trabalho, em formatos acessíveis, apropriados e que apresentem máxima efetividade de tais ações.
Percebe-se, portanto, uma tendência legislativa cada vez maior no sentido de exigir a existência de efetivos canais de denúncia por parte das empresas com o intuito de evitar situações de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, práticas cada vez menos toleradas no mundo corporativo e cada vez mais punidas severamente pelo judiciário e pelos órgãos de fiscalização (Ministério Público do Trabalho, Sindicatos etc.).
Por fim, o último passo para uma implementação de um programa de compliance eficiente é o seu monitoramento e a realização de auditorias, capazes de identificar falhas, avaliar a eficácia das políticas, mitigar riscos, demonstrar compromisso com a conformidade legal e ética, promover aprimoramentos contínuos e prevenir fraudes e irregularidades. Assim, as auditorias são essenciais para garantir a integridade e o sucesso do programa de compliance.
O monitoramento deverá ser realizado pelo responsável das atividades de compliance e a auditoria será realizada por alguém que não esteja relacionado, podendo ser interna – por alguém da empresa – ou externa – por uma pessoa especializada e contrata exclusivamente para isso.16
A implementação do programa de compliance implica em custos para a empresa, no entanto, os benefícios desse investimento são evidentes. Entre as vantagens, destacam-se: a capacidade de analisar o comportamento dos funcionários, o aumento da probabilidade de identificar e prevenir condutas ilícitas, a capacidade de reagir rapidamente a situações críticas, a melhoria da comunicação interna, a garantia de segurança aos funcionários para denunciar irregularidades, a redução das perdas financeiras decorrentes de multas, indenizações e tributos, e o fortalecimento da reputação da empresa tanto para clientes internos quanto externos17. No quadro abaixo é possível visualizar o impacto da implementação do Programa de Compliance:
| Aspecto | Antes da Implementação do Programa de Compliance | Depois da Implementação do Programa de Compliance |
| Incidência de assédio moral | Alta, com relatos frequentes de casos não resolvidos. | Redução significativa na incidência de casos de assédio moral; maior transparência na resolução de casos. |
| Comunicação interna | Limitada, com poucos canais para relatar problemas. | Implementação de canais de comunicação confidenciais e acessíveis para relatar casos de assédio moral. |
| Conscientização dos funcionários | Baixa, com falta de compreensão sobre o que constitui assédio moral. | Treinamentos regulares e campanhas de conscientização que ajudam os funcionários a reconhecerem e denunciarem o assédio moral. |
| Resposta da empresa | Reativa, com poucas medidas para prevenir futuros casos. | Proativa, com políticas claras de tolerância zero e medidas disciplinares para evitar e abordar o assédio moral. |
Considerações finais
Resta evidenciada, portanto, a importância do compliance na prevenção de casos de assédio moral, como pilar fundamental na criação de ambientes de trabalho seguros, éticos e respeitosos. Ao implementar programas de compliance eficazes, as empresas promovem uma cultura de ética e integridade, conscientizando seus funcionários sobre o assédio moral e garantindo que qualquer situação possa ser efetivamente denunciada, apurada e solucionada por meio de ferramentas efetivas e seguras. Ao priorizar o compliance como parte integrante da governança corporativa, as empresas fomentam a existência de ambientes de trabalho nos quais todos os colaboradores são respeitados e valorizados, aumentando a produtividade e, consequentemente, ampliando os resultados da empresa.
O compliance e todas as suas ferramentas permitem que as empresas, inclusive as do setor imobiliário, possam prevenir de forma efetiva casos de assédio moral em suas organizações.
Assim, investir na prevenção ao assédio com a elaboração de políticas anti-assédio eficazes e com a promoção de uma cultura organizacional pautada na ética e no respeito é essencial para mitigar os impactos sociais e financeiros do assédio moral nas empresas do setor imobiliário e garantir a sustentabilidade do negócio no longo prazo.
A implementação de um programa de compliance consistente irá garantir a observância dos princípios constitucionais de proteção à dignidade da pessoa humana e de cumprimento da função social da empresa, de princípios previstos em convenções e tratados internacionais (ONU, OIT etc.) e de princípios de ética e moral, cada vez mais exigidos pelo mercado, inclusive pelo mercado imobiliário.
- KPMG. “Pesquisa Maturidade do Compliance no Brasil”. Beyound Compliance. 5ª ed. 2021. Disponível em: https://assets.kpmg/content/dam/kpmg/br/pdf/2021/07/KPMG-pesquisa-maturidade-compliance-2021.pdf. ↩︎
- TST. “Justiça do Trabalho recebe mensalmente cerca de seis mil ações por assédio moral”, Notícias do TST, publicado em 07/07/2023. Disponível em: https://www.tst.jus.br/-/justi%C3%A7a-do-trabalho-recebe-mensalmente-cerca-de-seis-mil-a%C3%A7%C3%B5es-por-ass%C3%A9dio-moral%C2%A0. ↩︎
- MPT-PB. “Campanha setembro-amarelo”, publicado em 07/09/2023. Disponível em:https://www.prt13.mpt.mp.br/8-institucional/1913-campanha-setembro-amarelo-denuncias-de-assedio-moral-no-trabalho-crescem-61-na-paraiba-revela-mpt#:~:text=No%20Brasil%2C%20de%20janeiro%20a,registrou%20no%20Pa%C3%ADs%204.045%20casos. ↩︎
- Delgado, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 17ª ed. São Paulo: LTr, 2018. ↩︎
- Senado Federal. “Assédio moral e sexual no trabalho”. Biênio 2017-2019. Disponível em:https://www12.senado.leg.br/institucional/procuradoria/proc-publicacoes/cartilha-assedio-moral-e-sexual-no-trabalho. ↩︎
- Porath, Christine; Pearson, Christine. “The Price Of Incivility”. Harvard Business Review. Disponível em:https://hbr.org/2013/01/the-price-of-incivility#:~:text=Employees%20are%20less%20creative%20when,And%20incivility%20damages%20customer%20relationships. ↩︎
- 28ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro. Ação Civil Pública nº0010260-15.2014.5.01.0028. Juiz do Trabalho Pedro Figueiredo Waib. Sentença prolatada em 02/10/2015. ↩︎
- Albarracín, Juan Carlos Bajo. Compliance Officers: ISO 19600. Madrid: Ampell Consultores Asociados: 2015. ↩︎
- O IBGC é uma organização sem fins lucrativos criada em 27 de novembro de 1995, destinada à promoção de melhores práticas de gestão. Conferir em: https://www.ibgc.org.br/. ↩︎
- Mathies, Anaruez. Assédio moral e compliance na relação de emprego: dos danos e dos custos e instrumentos de prevenção. Curitiba: Juruá, 2018, p. 148. ↩︎
- Camargo, Coriolano Almeida; Santos, Cleórbete. Fundamentos do Compliance. Edição Kindle, 2019, p. 139. ↩︎
- Assi, Marcos. Gestão de compliance e seus desafios: como implementar controles internos, superar dificuldades e manter a eficiência dos negócios. São Paulo: Saint Paul, 2013, p. 39. ↩︎
- Srour, Robert Henry. Risco moral nas empresas e azares dos Códigos de Ética. A gestão de riscos de compliance como aliada da boa governança corporativa. São Paulo: Saint Paul, 2014. ↩︎
- Albarracín, Juan Carlos Bajo. Compliance Officers: ISO 19600, op. cit. ↩︎
- Cruz, Marco. Fazendo a coisa certa – como criar, implementar e monitorar programas efetivos de compliance. Porto Alegre: Simplíssimo [Edição Kindle], s/d. ↩︎
- Serpa, Alexandre da Cunha. Compliance descomplicado: uma guia simples e direito sobre programas de compliance. Edição Kindle, 2016. ↩︎
- Cruz, Marco. Fazendo a coisa certa – como criar, implementar e monitorar programas efetivos de compliance, op. cit. ↩︎

