
Inovações do Marco Legal das Garantias no âmbito da alienação fiduciária de bem imóvel
Resumo
O artigo propõe, por meio de uma incursão no tema da alienação fiduciária e no seu importante papel no mercado imobiliário, uma análise sobre as inovações da Lei nº 14.711/23, conhecida como Marco Legal das Garantias, em especial, no âmbito da execução da garantia fiduciária. A Lei trouxe significativas mudanças no âmbito das garantias e das medidas extrajudiciais para a recuperação de crédito, mediante a alteração e a introdução de novos dispositivos na Lei nº 9.514/1997, principalmente, sobre os procedimentos executórios extrajudiciais e sobre a alienação fiduciária superveniente. Propõe-se uma análise e uma avaliação dessas inovações, considerando o seu objetivo de trazer uma maior eficiência, transparência e segurança jurídica às operações que se utilizam da alienação fiduciária em garantia.
Introdução
O presente artigo visa analisar algumas das principais inovações apresentadas pela Lei nº 14.711/23 – também conhecida como Marco Legal das Garantias – no que tange ao pacto de alienação fiduciária em garantia.
A Lei nº 14.711/2023 trouxe mudanças significativas no sentido de aprimorar as regras relacionadas às garantias e às medidas extrajudiciais para a recuperação de créditos, conferindo maior segurança jurídica às operações imobiliárias reguladas pelo rito da alienação fiduciária.
Como ponto de partida da nossa análise, propomos uma incursão no tema do importante papel da alienação fiduciária no mercado imobiliário. Considerando a lógica do funcionamento da garantia que dá lastro à alienação fiduciária de imóvel, colocamos em destaque as inovações do Marco Legal das Garantias que tratam do tema, em especial, sobre os procedimentos executórios extrajudiciais e sobre a novidade da alienação fiduciária da propriedade superveniente. Por fim, avaliamos se essas inovações contribuem, de fato, para uma maior eficiência, transparência e segurança jurídica nas operações de financiamento.
1. O importante papel da alienação fiduciária em garantia no mercado imobiliário
Em regra, a alienação fiduciária baseia-se em uma operação que se estrutura mediante concessão de crédito acoplada a um contrato, pelo qual o devedor, ou terceiro garantidor, transmite ao credor, para garantia, a propriedade fiduciária de bens móveis ou imóveis, mas permanece na posse e continua a exercer diretamente o controle e a fruição dos direitos econômicos sobre os bens. Em caso de inadimplemento da obrigação garantida, o bem é convertido em dinheiro, destinando-se ao credor o quantum correspondente ao seu crédito e ao devedor (fiduciante) o saldo porventura apurado na venda do bem1. A alienação fiduciária é espécie de negócio em que se utiliza a transmissão da propriedade para fins de garantia, sendo que tal garantia exerce função semelhante às garantias reais imobiliárias que já integram o direito positivo, mas dotada de maior eficácia.2
Ao criar o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), a Lei nº 9.514/1997 instituiu em seu art. 17, entre outras garantias das operações de financiamento imobiliário (hipoteca, cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de alienação imobiliária, caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de alienação imobiliária), a alienação fiduciária de coisa imóvel. A sua regulação foi prevista do art. 22 ao art. 30 da mesma Lei. Desta maneira, o SFI supriu uma importante lacuna no sistema de garantias do sistema brasileiro à época em que entrou em vigência.
Vale lembrar que o Código Civil então vigente, de 1916, não continha nenhuma disciplina sobre o tema da alienação fiduciária em garantia (tanto de bem móvel quanto de bem imóvel). O fiduciário, naquele contexto, restringia-se à disciplina do fideicomisso, ou seja, figura da substituição testamentária. O que já vigia, naquela época, era a Lei nº 4.728/65 (Mercado de Capitais), cujo art. 66, alterado pelo Decreto-Lei nº 911/69 tratava, precisamente, sobre a alienação fiduciária de bens móveis. Este Decreto-Lei estabelece, ademais, as normas processuais sobre alienação fiduciária referente a bem móvel.
Fazendo-se uma leitura retrospectiva3, é perceptível como a alienação fiduciária de bem imóvel, regulamentada com o advento do Sistema Financeiro Imobiliário, se tornou um modelo de garantia perene e crucial para o desenvolvimento do mercado imobiliário dos últimos 27 anos, estando certamente ligado à crescente elevação da disponibilidade de crédito imobiliário para a aquisição de moradia. Isso porque, nos anos 90, outras modalidades de garantia, consideradas morosas quanto à sua execução em caso de inadimplemento, aumentavam substancialmente o risco na concessão do financiamento, assim como tornavam restrito o acesso ao crédito imobiliário.
Passados alguns anos da vigência da Lei nº 9.514/1997, a sistemática da alienação fiduciária passou, também, a integrar o Diploma Civilista, com a entrada em vigência do Código Civil de 2002, que incluiu, nos arts. 1.361 a 1.368, as regras gerais sobre a propriedade fiduciária, de caráter resolúvel, com escopo de garantia.
Pouco depois, a Lei nº 10.931/2004, que trata do patrimônio de afetação, das letras de crédito e das cédulas de crédito, introduziu no Código Civil o art. 1.368-A, segundo o qual: “As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial”. Embora, à primeira vista, este dispositivo possa não parecer importante, na verdade, ele trouxe um esclarecimento legislativo do ponto de vista sistemático, ratificando que a previsão do Código Civil constitui a regra geral, existindo, paralelamente, disciplina especial sobre a alienação fiduciária em garantia no que tange ao mercado de capitais. Sublinhe-se que a Lei nº 10.931/2004, também teve o condão de introduzir modificações na Lei nº 4.728/65 (sobre mercado de capitais), acerca das regras específicas de alienação fiduciária em garantia. Vale mencionar, nesse sentido, o art. 66-B, que estabelece a regra, para os contratos de alienação fiduciária celebrados no âmbito do mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários, de que contenham, além dos requisitos definidos no Código Civil, “a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver, e as demais comissões e encargos”.
Dez anos depois, a Lei nº 13.043/2014, entre diversas alterações, introduziu no Código Civil mais um dispositivo, o art. 1.368-B, sobre a propriedade fiduciária regulada por um contrato de garantia, não deixando mais pairar qualquer dúvida sobre o fato de que “a alienação fiduciária em garantia confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor”. Nesse sentido, esclarece o parágrafo único do art. 1.368-B que o credor fiduciário que se tornar proprietário do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, dação ou outra forma de transmissão plena do bem, passa a responder pelos tributos, despesas e encargos que recaiam sobre a propriedade do bem. Ademais, sublinhe-se que algumas alterações da Lei nº 13.043/2014 também incidiram sobre o Decreto-Lei nº 911/69, promovendo uma verdadeira atualização legislativa no tocante à alienação fiduciária em garantida por bem móvel.
Ou seja, se lançarmos luz sobre o cenário do SFI das últimas décadas, é notável como foi o seu modelo de garantias que estabeleceu, de modo pioneiro, a sistematização e as bases jurídicas para a logística do mercado envolvendo as operações de financiamento imobiliário. Provavelmente sem este modelo, o mercado imobiliário não teria conhecido sucessivos momentos de expansão nas últimas décadas.
No entanto, ainda que a Lei nº 9.514/1997 tenha apresentado expressamente os procedimentos a serem adotados na execução da garantia fiduciária, isso não impediu o aparecimento de diversos tipos de demanda no Poder Judiciário, como, por exemplo, sobre a aplicação do CDC ao universo da Lei nº 9.514/97. O Tema nº 1.095 do STJ pacificou a questão, determinando que: “Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrado em cartório, a resolução do pacto, na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituído em mora, deverá observar a forma prevista na Lei nº 9.514/97, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor”.4
Quanto ao Marco Legal das Garantias (Lei nº 14.711/2023), no que tange à alienação fiduciária de bem imóvel, seu principal objetivo foi o aperfeiçoamento dos procedimentos executórios pela via extrajudicial, dos Ofícios de Registro de Imóveis, ou pela via judicial, além de outras novidades, como a alienação fiduciária superveniente. Como afirmam Oliveira e Tartuce5, o Marco Legal das Garantias aprimorou as garantias reais (aí incluído o procedimento da alienação fiduciária), com o objetivo de estimular a concessão de crédito, trazendo maior segurança e agilidade às transações imobiliárias.

2. Alterações do procedimento executório extrajudicial das alienações fiduciárias pelo Marco Legal das Garantias
O Marco Legal das Garantias trouxe alterações em boa parte dos dispositivos da Lei nº 9.514/97 que tratam da alienação fiduciária de bem imóvel. A começar pela alteração do art. 22, o qual passa a enfatizar, quanto ao conceito da alienação fiduciária de bem imóvel, que o escopo da garantia é o da obrigação própria ou de terceiro. Ou seja, a figura do terceiro fiduciante está agora expressamente incluída em diversos dispositivos, como (i) o art. 25, §1º, que determina, no caso de pagamento da dívida, o prazo de 30 dias para o fiduciário fornecer o termo de quitação ao devedor (ou ao terceiro fiduciante); ou (ii) o art. 26, que determina a consolidação da propriedade do imóvel em nome do fiduciário, no caso de a dívida se encontrar vencida e não paga, no todo ou em parte, e constituídos em mora o devedor (e, se for o caso, o terceiro fiduciante).
No que tange ao procedimento executório extrajudicial das alienações fiduciárias, com as alterações dos arts. 26, 26-A e 27, o Marco Legal das Garantias apresenta duas principais finalidades no âmbito das alienações fiduciárias: (1) a maior eficiência nos procedimentos relacionados à execução da garantia fiduciária e (2) a prevenção de possíveis litígios entre as partes, evitando, dessa forma, judicializações desnecessárias.
Em eventual caso de inadimplência do devedor ou terceiro fiduciante, o trâmite de excussão da garantia fiduciária seguirá o já conhecido rito extrajudicial, devendo ocorrer a notificação do devedor para purgar a mora em 15 dias, sob pena de o imóvel ser levado à leilão, nos termos do art. 26, §§1º e 3º. Nesse sentido, diante da falta de pagamento de prestações por parte do devedor-fiduciante, caberá ao credor fiduciário intimá-lo para purgar a mora, no prazo de 15 dias, sendo possibilitado ao fiduciante o direito de purgar a mora. Contudo, caso deixe de efetuar tal pagamento, ensejará ao fiduciário o recolhimento do imposto de transmissão cabível, ao efeito de consolidar a propriedade em seu nome, seguindo-se a promoção de leilão público para a venda do imóvel, respeitadas todas as previsões legais quanto à intimação e prazos para realização de tais procedimentos.
Destaca-se que a nova Lei atualizou o procedimento de intimação e execução do crédito fiduciário para se adequar às alterações do CPC de 2015, sobre “as quais ainda geravam aqui ou ali alguma dúvida e com essa nova lei vieram a ser todas elas solucionadas6.” Nesse sentido, a intimação pessoal será realizada, a requerimento do fiduciário, pelo Oficial do Registro de Imóveis competente (art. 26, §1º) ou, também, por Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento (art. 26, §3º).
Inova o Marco Legal das Garantias ao estabelecer no art. 26, §1º-A, introduzido na Lei nº 9.514/97, que, em havendo imóveis localizados em mais de uma circunscrição imobiliária em garantia da mesma dívida, “a intimação para purgação da mora poderá ser requerida a qualquer um dos registradores competentes e, uma vez realizada, importa em cumprimento do requisito de intimação em todos os procedimentos de excussão, desde que informe a totalidade da dívida e dos imóveis passíveis de consolidação de propriedade”.
Além disso, de acordo com o art. 26, §4º-A, introduzido pelo Marco Legal das Garantias na Lei nº 9.514/97, “é responsabilidade do devedor e, se for o caso, do terceiro fiduciante informar ao credor fiduciário sobre a alteração de seu domicílio”. Ainda, no §4º-B do mesmo artigo: “presume-se que o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante encontram-se em lugar ignorado quando não forem encontrados no local do imóvel dado em garantia nem no endereço que tenham fornecido por último, observado que, na hipótese de o devedor ter fornecido contato eletrônico no contrato, é imprescindível o envio da intimação por essa via com, no mínimo, 15 (quinze) dias de antecedência da realização de intimação edilícia”.
Após esgotados os procedimentos notificatórios, restou alterado o prazo para a realização do primeiro leilão do imóvel, o qual aumentou de 30 para 60 dias contados da averbação da consolidação da propriedade em nome do fiduciário na matrícula do imóvel, nos termos da nova redação dada ao art. 27 da Lei: “Consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário promoverá leilão público para a alienação do imóvel, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data do registro de que trata o § 7º do art. 26 desta Lei”. Nesse sentido, possibilitou-se maior prazo para que o credor operacionalize os trâmites cartorários e administrativos.
O caso específico do procedimento de leilão decorrente de financiamento para a aquisição ou construção de imóvel residencial, exceto quanto às operações do sistema de consórcios, deve seguir o regramento do art. 26-A. Neste caso, no segundo leilão, permanece sendo aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela alienação fiduciária, mais os acréscimos legalmente previstos, nos termos do §3º do art. 26-A. Entretanto, de acordo com o §4º do art. 26-A, caso não haja lance que atenda este referencial mínimo para a arrematação, o imóvel ficará adjudicado ao credor e a dívida será considerada extinta, com recíproca quitação. Assim sendo, o credor ficará investido da livre disponibilidade do imóvel, podendo vendê-lo a terceiros pelo valor que lhe aprouver.
Já no que se refere aos procedimentos de leilão decorrentes das demais dívidas garantidas por alienação fiduciária de bem imóvel, em especial, operações de crédito, que não estão sujeitas às normas especiais previstas no art. 26-A, na hipótese em que, no segundo leilão, não haja lance que alcance o valor integral da dívida garantida e os acréscimos previstos na Lei, de acordo com o art. 27, §2º, ficará a exclusivo critério do credor fiduciário, aceitar o lance que corresponda a, pelo menos, 50% do valor de avaliação do bem. Porém, se o produto do leilão não for suficiente para o pagamento integral do montante da dívida, das despesas e dos encargos, então, vale o disposto no art. 27, §5º-A, de acordo com o qual, “o devedor continuará obrigado pelo pagamento do saldo remanescente, que poderá ser cobrado por meio de ação de execução e, se for o caso, excussão das demais garantias da dívida, ressalvada a hipótese de extinção do saldo devedor remanescente prevista no § 4º do art. 26-A desta Lei”.
Após a análise das principais inovações do Marco Legal das Garantias no tocante ao procedimento executório extrajudicial das alienações fiduciárias de bem imóvel, passamos a examinar o novo instituto da alienação fiduciária da propriedade superveniente.

3. A alienação fiduciária da propriedade superveniente
Uma das grandes inovações do Marco Legal das Garantias, com potencial repercussão no mercado imobiliário, é a previsão da alienação fiduciária da propriedade superveniente, com previsão no art. 22, §§3º e 4º, que consiste na permissão para que um mesmo bem imóvel, já alienado fiduciariamente, possa ser utilizado como garantia em nova operação de crédito, cuja eficácia fica condicionada ao cancelamento da propriedade fiduciária anterior. Neste sentido, o Marco Legal das Garantias ampliou a dinâmica e o alcance das operações reguladas pelo rito da alienação fiduciária.
Em outras palavras, surge no cenário jurídico uma nova modalidade de alienação fiduciária: a alienação fiduciária de “segundo grau” ou sucessiva, permitindo que um mesmo imóvel seja dado em garantia em múltiplas transações com operações de crédito. Ainda que um imóvel já possua um gravame por uma alienação fiduciária, isto é, virtualmente não faça parte do patrimônio do devedor, é permitido a ele não só oferecer a propriedade superveniente em garantia de novas eventuais dívidas, como também registrá-la desde a celebração do negócio.
Em caso de inadimplência do devedor, as alienações anteriores terão prioridade em relação às posteriores na excussão da garantia, tendo certa similaridade com o instituto da hipoteca. Com efeito, as alienações fiduciárias registradas na matrícula imobiliária seguirão uma ordem de preferência, ou seja, privilegiando-se as mais antigas sobre as mais recentes, de modo que, como dispõe o §4º do art. 22 da Lei nº 14.711/2023: “Havendo alienações fiduciárias sucessivas da propriedade superveniente, as anteriores terão prioridade em relação às posteriores na excussão da garantia, observado que, no caso de excussão do imóvel pelo credor fiduciário anterior com alienação a terceiros, os direitos dos credores fiduciários posteriores sub-rogam-se no preço obtido, cancelando-se os registros das respectivas alienações fiduciárias”.
Quando há sucessivas alienações fiduciárias de um imóvel em garantia, é preciso considerar os seguintes aspectos, segundo Oliveira e Tartuce7: a) o credor fiduciário de primeiro grau é titular do direito real de propriedade sujeito à condição resolutiva consistente no adimplemento da respectiva dívida; e b) os credores fiduciários de segundo ou mais graus serão titulares de um direito real de propriedade sujeito a duas condições: (i) a condição resolutiva, consistente no adimplemento da respectiva dívida garantida; e (ii) a condição suspensiva, relativa à extinção da propriedade fiduciária de grau inferior.
Em síntese, por meio deste novo sistema, vislumbra-se a oportunidade de uma nova alienação sobre o mesmo imóvel, preservando os direitos dos alienantes anteriores e abrindo caminho para sucessivas transações8. Pela nova dinamicidade do modelo de alienação fiduciária em garantia instituída pela propriedade superveniente, esta modalidade pode ser vista como um estímulo para a viabilização de novos negócios imobiliários. A possibilidade de utilizar um mesmo imóvel como garantia em diferentes operações de crédito, desde que respeitado o seu limite de valor para fins de garantia, poderá ser, ademais, um fator impulsionador da economia9. A expectativa, inclusive, é que essa prática tenha o potencial de reduzir as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras, em virtude da provável diminuição da inadimplência.
Não obstante, por mais que as expectativas sejam otimistas em relação à nova modalidade, convém observar com cautela o modo como ela será empregada, sobretudo a partir do momento em que surgirem divergências sobre a interpretação acerca da ordem de preferências, sendo um dos principais desafios a de uma aplicação uniforme da Lei em todo o país.
Considerações finais
Ao criar o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), a Lei nº 9.514/1997 estabeleceu como garantia das operações de financiamento imobiliário a alienação fiduciária de coisa imóvel, preenchendo uma lacuna e conferindo maior segurança jurídica aos contratos de promessa de compra e venda que dependem da obtenção de crédito.
O Marco Legal das Garantias, instituído pela Lei nº 14.711/23, introduziu inovações significativas sobre a alienação fiduciária, em especial, no tocante à consolidação e execução extrajudicial da dívida. Essas mudanças tem o potencial de simplificar e agilizar os procedimentos relacionados à execução extrajudicial do devedor ou terceiro fiduciante.
Outra grande inovação é a possibilidade de sucessivas alienações imobiliárias sobre um mesmo imóvel (propriedade superveniente), com a prioridade das anteriores sobre as posteriores na excussão da garantia. Essa modalidade contribui potencialmente para a redução dos custos de operações financeiras. Este efeito é esperado por conta da celeridade e da maior previsibilidade que os processos extrajudiciais podem imprimir nas diferentes operações10. No entanto, somente com o tempo poderemos saber se as mudanças do regime da alienação fiduciária surtirão os efeitos desejados e como essas regras serão interpretadas pelos Tribunais.
- Chalhub, Melhim Namem. Alienação Fiduciária: negócio fiduciário. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019 [Edição Kindle], p. 106. ↩︎
- Ibidem, p. 257. ↩︎
- Gomide, Alexandre Junqueira. “A (tardia) declaração de constitucionalidade da lei 9.514/1997”. Publicado em: 01/11/2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-edilicias/396281/a-tardia-declaracao-de-constitucionalidade-da-lei-9-514-1997 ↩︎
- Para um maior aprofundamento sobre esta questão, consultar: Girelli, André Ferronato. “Reflexões sobre o Tema 1095 do STJ: A prevalência da alienação fiduciária em relação ao CDC”. Temais atuais de direito imobiliário. Vol. 06. Porto Alegre: Santos Silveiro, 2023, p. 103-118. ↩︎
- Oliveira, Carlos E. Elias de; Tartuce, Flávio. Lei das Garantias: Alienação Fiduciária em Garantia, Execução Extrajudicial, Cartórios, Desjudicialização e Outros Temas. Rio de Janeiro: Forense, 2024 [Edição Kindle], p. 20. ↩︎
- Chalhub, Melhim Namem. “Marco das garantias promove segurança jurídica”. Publicado em: 08.11.2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/396561/marco-das-garantias-promove-seguranca-
juridica-dizem-especialistas ↩︎ - Oliveira, Carlos E. Elias de; Tartuce, Flávio. Lei das Garantias: Alienação Fiduciária em Garantia, Execução Extrajudicial, Cartorários, Desjudicialização e Outros Temas, op. cit., p. 31-32. ↩︎
- Associação Brasileira dos Advogados – ABA/RJ. “Desvendando os Impactos do Marco Legal das Garantias nas Transações Imobiliárias: Uma Análise Preliminar”. Publicado em: 19/03/2024. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/desvendando-os-impactos-do-marco-legal-das-garantias-nas-transacoes-imobiliarias-uma-analise-preliminar/2239440294 ↩︎
- Associação Brasileira dos Advogados – ABA/RJ. Desvendando os Impactos do Marco Legal das Garantias nas Transações Imobiliárias: Uma Análise Preliminar. Publicado em: 19/03/2024. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/desvendando-os-impactos-do-marco-legal-das-garantias-nas-transacoes-imobiliarias-uma-analise-preliminar/2239440294 ↩︎
- Cf. Migalhas. “Mudanças trazidas pelo marco legal das garantias”. Publicado em: 01/11/2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/396289/advog ↩︎
